INES PEREIRA MACIEL é uma escritora, poeta, advogada e professora brasileira. Nasceu na cidade de Caxias/Maranhão no dia 05 de maio de 1950. É membro efetivo da Academia Caxiense de Letras (ACL), ocupando a cadeira no 18; membro efetivo da Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil-Coordenação do Maranhão (AJEB/MA) e membro da Sociedade de Cultura Latina do Estado do Maranhão (SCLMA). Uma das escritoras homenageadas no IV Colóquio Internacional de Literatura e Gênero, promovido pela Universidade Estadual do Piauí-UESPI (2018) e da VII Feira da Literatura, Cultura e Turismo da Região dos Cocais -FLICT (2024), suas obras literárias têm sido utilizadas em produções de graduação, sobretudo no Campus de Timon da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), e pós-graduação da mesma universidade, assim como pela rede de ensino municipal de Caxias/Ma. Sua atração pelo mundo literário manifestou-se desde a infância. Aos doze anos de idade escreveu sua primeira poesia intitulada Quimera e que integra seu primeiro livro nesta modalidade. Auditora Fiscal do Trabalho do MTE (1978, e inativa a partir de 2002) fez parte da Equipe de Fiscalização Móvel do Combate ao Trabalho Escravo e Infantil desse Ministério. Concomitante, foi Professora Assistente da Universidade Estadual do Maranhão (1981-1990). Atualmente, dedica-se majoritariamente à escrita, com participação em eventos literários através de entrevistas, palestras, seminários, exposições e antologias nacionais e internacionais. Obras publicadas: Ramas do Tempo (2003), Despida (2008; 2014) – Poesia; Virna (2014) – Romance; A Menina dos Olhos de Peteca (2013) – Literatura Infantil; Recôndito (2016) – Poesia.
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- Paulo Rodrigues – Poeta Inês Maciel, a Hilda Hilst disse: “Costuro o infinito sobre o peito”. Você também costura o infinito?
Inês Maciel – A grandiosidade do universo encanta, desafia e estimula o ser humano nesta busca incansável de tentar abarcar o infinito, criar elos com o imensurável. E o amor, este fio invisível da vida que conecta, inspira e cria elos sem limites, proporciona esta grandiosidade no interior do nosso eu, no centro de nossas emoções.
A minha maior inspiração poética sempre foi e continua sendo o amor, nas suas mais diferentes formas e intensidades. Através dele eu mergulho nas vastidões do meu eu, crio laços profundos com o interior do meu ser, espaço onde se aninham as minhas emoções, sentimentos e recordações. Porque o amor, quando vivido intensamente no corpo e na alma, ele nos permite sentir esta infinitude, como a própria vida em sua essência invisível.
Então sim, eu também costuro o infinito no peito como aqueles que amam, e têm o amor como inspiração maior, tal como magistralmente poetizou Hilda Hilst, esta que é considerada uma das maiores escritoras em língua portuguesa do Século XX.
- Paulo Rodrigues – Poeta, como é o seu processo criativo?
Inês Maciel – Vivo o presente como uma adolescente: cada dia uma descoberta, uma dádiva a ser agradecida. Porém, eu sou do ontem, trago marcas do tempo tatuadas no corpo e na alma. Inúmeras gavetas fechadas do meu passado guardam lembranças sonolentas que eu cato em inesperados momentos. O silêncio guarda todas essas chaves para mim. É meu guardião.
Eu gosto de acariciar pedaços do passado, são inspiradores, as recordações são emoções resistentes. Mas meus olhos pertencem ao instante. É nele, no momento, que colho as emoções nascentes, aquelas que ainda não fluíram no rio do meu tempo.
Sou um ser contemplativo, a observação é o campo minado das minhas emoções o que me faz extremamente vulnerável aos estímulos que me cercam. Choro fácil, sorrio mais facilmente ainda. Colho os instantes da vida com a intensidade que eles são: únicos, e passageiros. A poesia é minha parceira nesta colheita.
Meus poemas não se prendem a regras de métrica ou rima, são livres para usá-las ou não. Surgem espontaneamente, no colher de emoções momentâneas, sentimentos vivenciados, recordações guardadas. São as vozes do meu coração. Minha maior liberdade. Não conheço liberdade maior do que a do pensamento: vai aonde quer, fica onde quer e volta quando quer. E sem custos. E as palavras são as maiores amigas das minhas emoções e do meu pensamento. Escrever é um gesto de amor que faço para comigo mesma. Não tenho método. Escrevo porque necessito. A escrita é o oxigênio que minha alma respira.
Meu processo criativo, portanto, é muito natural, não tem roteiro, não tem regras, não tem planejamento. É extremamente espontâneo. E momentâneo. E como tudo que é espontâneo, ele é muito simples, talvez até rústico, sem sofisticações e cuidados especiais.

- Paulo Rodrigues – Quais autores da literatura brasileira influenciam na sua produção literária?
Inês Maciel – A minha maior influência literária é a própria vida. Minhas vivências, emoções e silêncios dialogam intimamente com as palavras que ditam os meus escritos. A vida é meu maior livro. Tudo que vivo encontra ressonância no que escrevo.
Considero ainda que referidas influências alicerçam-se também nas leituras que me acompanharam ao longo dos anos, que vão de grandes clássicos até vozes contemporâneas, cujos ecos inspiram meu processo criativo. Escritores renomados da literatura brasileira como Érico Veríssimo, Jorge Amado, Euclides da Cunha, José de Alencar, Raquel de Queiroz, Josué Montello, citando alguns entre tantos, desafiaram a minha imaginação, ensinando-me a perceber, meditar, refletir e até mesmo idealizar o mundo!
Na poesia, carrego as influências das obras de admiráveis poetas conterrâneos, dentre os quais destaco Gonçalves Dias, e de outros grandes poetas brasileiros como Vicente de Carvalho, Olavo Bilac, Raimundo Correa, Cecília Meirelles, Mário Quintana, Manuel Bandeira, Vinícius de Moraes, João Cabral de Melo, entre outros, que me ensinaram a cadência da alma e o caminhar da sensibilidade.
Cada influência é um diálogo íntimo com a minha voz.
- Paulo Rodrigues – Você tema acompanhado a literatura contemporânea do Maranhão?
Inês Maciel – Sim, acompanho com interesse! A literatura maranhense contemporânea está cada vez mais viva e fértil, marcada pela pluralidade de vozes e diversidade de estética, abrindo espaço para novas formas de expressão. Herdeira de um passado literário glorioso, ela é o espaço de confluência entre a tradição e a renovação, um mosaico de vozes entrelaçando raízes antigas com novas formas de criação.
A lista de poetas e escritores maranhenses contemporâneos é extensa. Projetos coletivos, antologias, prêmios literários, iniciativas acadêmicas, plataformas literárias, dentre outros, vêm desempenhando um papel fundamental na circulação desta literatura atual, ampliando a visibilidade desses autores e favorecendo a divulgação de suas obras.
A escrita feminina maranhense pulsa com vitalidade, através de múltiplas vozes, estilos e temáticas, fortalecendo a presença da mulher na presente cena literária.
A literatura maranhense contemporânea se firma, assim, como um território que se reinventa, acolhendo a inovação e valorizando a herança de uma história literária ilustre.

- Paulo Rodrigues – Poeta, fale um pouco sobre o livro Recôndito.
Inês Maciel – O livro Recôndito, meu segundo livro de poesia, publicado em 2016, é composto de 100 poemas que versam sobre temas universais, como a vida, a morte, o amor e sofrimento, expressos por meio da minha subjetividade e inspiração poética. São poemas escritos numa fase mais intimista, na maturidade dos anos, fazendo referência à descrição de sentimentos e lembranças, com destaque às minhas vivências particulares em minha cidade berço.
A aceitação e utilização desta minha obra em produções de graduação, sobretudo no Campus de Timon da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), e programa de pós-graduação da mesma universidade, têm proporcionado inesperados e gratificantes retornos incentivadores na minha modesta trajetória no campo da literatura. A alma de um poeta, quando captada por meio de seus poemas, cria asas através dos olhos que a captam, e se faz mais livre que o próprio vento.
Recôndito é uma extensão de minha alma que eu compartilho com os leitores.

- Paulo Rodrigues – Você também escreve crônicas? Ramas do tempo foi bem recebido pelos leitores?
Inês Maciel – Eu sempre fui muito diversificada na minha escrita. Já me atrevi a excursionar tanto no gênero narrativo (crônica, romance e conto) como no lírico ( poesia), apesar de sentir uma inclinação mais tendenciosa à poesia. Todavia, não foi através da poesia que se deu meu ingresso no mundo da literatura. Iniciei minha carreira literária em 2001, escrevendo crônicas para um jornal de minha cidade natal, abordando assuntos embasados em memórias afetivas, o cotidiano da cidade, sua gente, perpassando por questões sociais, culturais, ambientais, políticas, dentre outras, as quais tiveram uma boa recepção por parte dos leitores do referido jornal durante os dois anos em que prestei referida colaboração ao mesmo.
O livro Ramas do Tempo, publicado em 2003, reúne essas crônicas e obteve bastante aceitação, principalmente por leitores conterrâneos, deixando-me honrada e agradecida.
- Paulo Rodrigues – Quais são os novos projetos literários da poeta?
Inês Maciel – Meu projeto literário é continuar escrevendo. Escrever é uma necessidade vital do meu ser, é meu projeto constante.
Atualmente, debruço-me sobre meu segundo romance, finalizo uma nova obra voltada ao público infantil e organizo a publicação do meu terceiro livro de poesia, cujo lançamento espero concretizar no primeiro trimestre de 2026. Sendo assim, meu projeto literário é permitir que as palavras continuem a me direcionar.
- Paulo Rodrigues – Deixe uma mensagem para os nossos leitores e leitoras.
Inês Maciel – Sou uma sonhadora nata e persistente. Os muitos anos já vividos não conseguiram alquebrar a minha esperança e nem extinguir a essência do amor que me impulsiona. A poesia é meu pincel amigo que usa a aquarela dos sonhos para dar cor à minha existência.
Minha mensagem aos que me leem é, portanto, uma mensagem de amor e esperança: que nunca deixemos de acreditar na força do amor e de sonhar com o poder transformador da literatura.
POEMAS
DE
INÊS PEREIRA MACIEL
Provinciana
Sou provinciana, sou como uma abelha,
E se assim sou, assim gosto de ser…
Sou rústica, sou da terra, sou cabreira,
Mas sou livre em minha forma de viver.
Sou como a chuva que molha o campo,
Sou como a jabuticaba, pau d’arco, jatobá,
Sou como faísca passageira de um relâmpago,
Sou como um bicho, sou do mato, sou de lá…
Sou como uma nuvem que passa errante
Sobre um entrelaçado de vida abundante
Onde a natureza e a poesia são as tecelãs…
Mas trago nos olhos o piscar dos vaga-lumes,
E entranhado na alma eu guardo o perfume
Das flores silvestres, no alvor das manhãs.
Rio Itapecuru
Todas as nascentes do meu ser
Convergem para um mesmo rio
Com cheiro de capim e mururu:
Itapecuru.
Rio que flui no meu peito,
Desemboca no mar do tempo
Com leveza e profundidade,
Umedecendo lembranças
Que nem o esquecimento apaga.
No meio das águas deste rio
Correm as minhas saudades.
Inquietude
Tenho inquietudes na alma
Trazidas dos altos píncaros
Não alcançados
Por meus pés cansados.
Tenho anjos de asa cobertas
Pelo limo do passado
E sulcos na fronte
Feitos pelas águas do tempo…
Dispersas gaivotas da ilusão
Ainda vagueiam sobre mim,
Mas já não existem pousos…
No subterrâneo do meu eu
Os alicerces foram demolidos.
São muitas sombras na escuridão
Aguardando a luz que as reflitam…
Mas são tão escassas as estrelas!
Tenho inquietudes na alma
Presas pelas algemas do engano,
Asfixiadas pelas mãos do medo,
E pisadas pelos pés dos anos…
Tenho inquietudes, e rochedos.
(*Poema classificado e integrante do livro A Vida em Poesia II – 2ª edição do Festival de Poesia de Lisboa/Portugal)
O rio e eu
Corto as águas sonolentas do rio
Com a espada dos meus olhos
E recolho, no fundo do seu leito,
Conchas de recordações
Adormecidas da infância,
Encobertas pelo limo do tempo…
O sol, indiferente, desce no crepúsculo,
Encharcado de nuvens purpúreas e navegantes.
Diante de mim, o fim do dia e o passar das águas…
Temo pela beleza do momento que se esvai.
Até onde a vista alcança,
Abraço as curvas sinuosas do rio,
As nuvens rubras e douradas pelo sol,
As vozes caladas do silêncio.
O rio e eu corremos paralelos
Na neblina do passado.
E ao cair da noite,
Sem mais o sol, sem mais o rio,
Eu me hospedo nas estrelas.
(livro Recôndito)
Metades
Sou metades:
Metade árvore,
metade pássaro…
Nas raízes,
sangue e barro;
Nas asas,
sonhos e liberdade.
Sol do tempo
O sol do tempo
Projeta minha sombra
Na imensa tela da existência
E nela vislumbro
As floridas primaveras
dos meus felizes momentos,
Os cálidos verões
dos meus ardentes sonhos,
Os outonos entardecidos
dos meus dias opacos,
E os invernos nevados
dos meus alquebrados anos.
A minha sombra carrega
Cuidadosamente
Todos os passos
Incontáveis
Dos pés de minha andança.
Os sinos do final da tarde
Nas seis de Maria,
No entardecer de Caxias,
Não mais repicam os sinos
Que soavam como hino
No alto da torre da Catedral…
Não mais as doces andorinhas
Que em bando, e nunca sozinhas,
No crepuscular da tarde dormente
Abrigo buscavam contentes
No alto da torre da Catedral…
Não mais a grande fábrica apita,
Não mais o trem chega, ou vai…
A criançada da rua já não grita,
E o palhaço já não cantarola mais…
Tal os sinos, da torre da Catedral.
O morro com nome de flor do campo
Onde a história construiu seu camarim,
Já não tem mistérios, perdeu encantos,
Apesar das belas ruas, casas e jardins.
Tal os sinos da torre da Catedral…
O velho grande rio parece encolhido,
Correndo acanhado, num leito sofrido,
Emudecido, sem sua mata ciliar exuberante,
Sem suas águas puras, refrescantes…
Tal os sinos da torre da Catedral.
A ponte velha de madeira não mais existe
A refletir os finais dourados das tardes…
E no Roncador, as borbulhas que persistem
Já não saltam e cintilam com alarde…
Tal os sinos da torre da Catedral.
Não mais meus sonhos meninos
Descem, ou sobem, sorrindo,
Aquelas antigas ruas sem asfaltos,
As velhas praças, o morro alto,
E a torre imponente da Catedral…
Calaram-se os sinos dos finais das tardes.
Hoje calados, hoje assim dormentes,
Eles são apenas vestígios da saudade
De um tempo que deixou de ser presente…
Nas seis horas de Maria,
Hoje, em mim, melancolia.
(Livro Recôndito)
Meu grito
Rimo nos meus versos
Os opostos, os inversos,
O que me fala o coração…
Perco-me no meu próprio grito
Que sufocado, fraco, aflito,
Só mesmo eu escuto o seu refrão.
(Livro Despida)
Ausências
Há uma tristeza tão próxima
Que se fez murmúrios de mim.
Melancolia do ocaso
Que se curva em mistérios.
Há sombras no frescor do verde,
Há desertos sob meus pés,
Há árvores caídas no meu caminho,
Cansaço em passos
Que já não levam a lugar nenhum…
Reflexos de mim escorrem,
Serenamente,
No rio da minha vida.
Por meus olhos opacos
Desfilam cidades mortas,
Rostos petrificados,
Desenhos impressos
Nos mosaicos soltos
Da penumbra do tempo.
Para sempre, terei ausências.
O ninho
Quem vive no só, sozinho,
Aprendeu a entender
Que solidão é o ninho
De quem desbrava o viver…
De quem se agasalha no silêncio
Das palavras não ditas,
Deixando para trás o vazio
Das inúteis, mal faladas, ou desditas.
Quem vive no só, sozinho,
Tem mãos marcadas pelo tempo
Que tecem com paciência esse ninho
Que será levado, um dia, pelo vento.
(livro Despida)
Nós dois
Na paz do nosso sonho,
No sonho de nossa paz,
Eu te escondo os mistérios da dor
E te revelo os segredos do amor.
E assim, distantes do mundo,
E com as almas bem mais unidas,
As horas se tornam segundos,
Segundos que valem uma vida!
E eu, em efêmero espaço,
Presa por laços que não desfaço,
Corro, canso, caio,
Fujo, volto, retalho, refaço…
Ao teu lado, em teu compasso.
(livro Recôndito)
*
Paulo Rodrigues, entrevistador, é jornalista e poeta, autor de Cordilheira (2024) e outros livros premiados.
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