Sacada Literária

Cultura, crítica e divulgação

Ítalo Calvino - Fonte: www.jornalopcao.com.br

100 ANOS DE ITALO CALVINO

 

Lourival Serejo *

 

A comemoração do centenário de nascimento de Italo Calvino não é só italiana, mas de todo o mundo onde chegou sua literatura.

Nascido em 15 de outubro de 1923, em Santiago de Las Vegas, na ilha de Cuba, Italo Calvino tornou-se um dos escritores mais representativos da literatura contemporânea. Como disse a reportagem do Corriere della Sera, no dia do seu aniversário, “uno dei piú influenti e poliedrici scrittori del secondo Novecento”

Calvino era filho de pais cientistas, Mário Calvino e Evelina Manueli, que mantinham em casa uma biblioteca de 12 mil volumes.

Na adolescência, Calvino torna-se um ativo partigiano, na resistência contra os nazi-fascistas. Os partigianos eram os grupos de pessoas que se organizavam para lutar contra a ocupação alemã e contra o fascismo.

Essa experiência de luta nas montanhas e no ambiente de guerra rendeu a Calvino dois livros: A entrada na guerra (L´entrata in guerra) e O atalho dos ninhos de aranha (Il sentiero dei nidi de ragno). Publicado em 1946, O atalho dos ninhos de aranha inaugurou a sua fase neorrealista.

Calvino falece em 1985, na noite de 18 de setembro, com 62 anos de idade, vítima de um derrame. Foi sepultado em Castiglione di Pescaia.

 No Brasil, temos o privilégio de ter quase todas as obras de Italo Calvino publicadas pela Companhia das Letras.  As duas últimas foram Nasci na américa… Uma vida em 101 conversas, com 618 páginas, e  Por último vem o corvo (Ultimo viene il corvo). Está no projeto dessa editora, para breve, o lançamento das correspondências de Calvino, que alcançam mais de 5 mil cartas.

A obra de Calvino é vasta, composta de romances, contos, poesia, crítica literária, artigos, fábulas, resenhas, artigos jornalísticos e crônicas de viagens.

Entre 1952 e 1959, Calvino publicou a trilogia que o tornaria conhecido em todo o mundo pela sua capacidade criativa, estilo e  nível elevado da ficção. Essa trilogia foi denominada Nossos antepassados (Nostri antenati) e é composta pelos livros O visconde partido ao meio (Il visconte dimezzato), O barão das árvores (Il barone rampante) e O cavaleiro inexistente (Il cavaliere inexistente).

Nas narrativas de Calvino é comum encontrarem-se o uso de metáforas, alegorias e imagens poéticas, conduzindo-nos para um realismo mágico diferente do que marcou esse movimento na América Latina. O que prende o leitor em contato com a escrita de Calvino é leveza e a sobriedade do seu estilo. Não há dúvida de que todo o catecismo da arte de escrever desse notável escritor está nas Seis propostas para o próximo milênio (Lezioni americane).

As cidades invisíveis (Le cittá invisibili) é a quintessência da ficção. A arquitetura da obra é um universo formado por 55 cidades imaginárias, todas com nomes de mulheres,  começando com Diomira e terminando com Berenice.

Essa obra, considerada a mais importante na bibliografia de Calvino, trata de descrições de utopias, numa dialética entre o real e o imaginário,  de desejos em busca (uma busca descontínua ) de uma cidade ideal para se viver. Nessa viagem,  pelo simbólico do reino da linguagem, Calvino perturba o leitor para definir se se trata de um romance ou de contos. Sem dúvida, alguns contos despontam, mas, na essência, trata-se de poesias em prosa.

O ideal seria falar de todas as obras de Calvino, porém o espaço não permite esse agradável devaneio. Mas é difícil falar dele sem lembrar de Se um viajante numa noite de inverno (Se una notte d`inverno un viggiatore), Por que ler os clássicos (Perché leggere i classici), As fábulas italianas (Fiabe italiane), Um eremita em Paris (Eremita a Parigi) e Palomar. Este último livro, de feição autobiográfica, é uma lição sobre a arte de olhar. Como disse Marco Belpoliti, em sua obra L´occhio di Calvino: “Calvino é um escritor visual”, que nos ensina que ver é perceber as diferenças. Aguzzare lo sguardo per vedere.

Como percebe o leitor, só por esta piccola amostra, Italo Calvino tem todo o mérito para merecer a comemoração do seu centenário de nascimento.

 

Lourival Serejo – escritor, desembargador, presidente da Academia Maranhense de Letras

 

 

 

 

 

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