Sacada Literária

Cultura, crítica e divulgação

São Luis - Beira-Mar. Foto-William-Amorim

LUDOVICA

                             

Bioque Mesito

ao meu amigo, Francisco das Chagas Araújo

 

I)

 

no meio da tua cara rachada o potente sol

que espelha imponente o palácio dos leões

ameaça constante da esperteza de governantes

que burlam o bom astral dos ludovicenses

 

das velhas súplicas de artistas populares

por azulejos fontes ladeiras ou casarões

não és mais a formosa madame equinocial

mas amontoada em bolsões de pobreza

 

não vemos mais um parecer de encantos

que mudou entre esgotos tua trajetória

o amor aos poucos por aqui vai embora

 

a cidade que inspirou piratas e poetas

esplende caudalosa na ponta da areia

como se parasse no tempo toda singeleza

 

 

II)

reitero que o tempo mudou

toda a história que contaram

 

upaon-açu de guerreiros

relegada a povo castigado

 

não acredito que nesta

terra pisou gonçalves dias

 

muito se envergonharia

no estado em que ficamos

 

 

III)

a são luís

do passado

se insinuava

 

a cada esquina

que se passava

 

a são luís

de agora

só alegoria

 

 

IV)

 

a propósito de um ser falido

te embrenhas em inútil círculo

de província que apenas espera

 

não és mais imponente atenas

mas parte de muitas gentes

que foge da castigante roça

 

 

V)

 

assinatura reconhecida

do fracasso orbitante

carregas na pele mítica

os batuques ancestrais

 

Tambor de Crioula do Maranhão. Fonte: Fundação Palmares – Divulgação            https://www.palmares.gov.br/

o tambor de crioula

o bumba-meu-boi

o cacuriá a quadrilha

o carnaval de passarela

 

ritos que às vezes manobrados

pelo bel-prazer de facínoras

se aproveitam do suor festivo

ao deixarem ignóbeis rastros

 

 

VI)

 

em tua testa trêmula

o paraíso decadente

rarefeita entre versos

 

pouco há o que se dizer

como se estacas batessem

gorgolejando teu ventre

 

de bandoleiros cargueiros

que ocultam riquezas

 

oscilas turva no atlântico

como serpente adormecida

 

 

VII)

 

os ventos que sopram

revigoram os mangues

 

da herança das palafitas

a ginga das pedras de jah

 

o centro histórico não é

mais só o cenário boêmio

 

não és mais a rota noturna

da carruagem de ana jansen

 

engendrada entre o caos

os cacos de tuas ruínas

 

 

VIII)

 

entre os ícones marcantes

de teus símbolos te despedes

tribuzi chagas nauro gullar

 

os que continuam

demarcam madrugadas

no estirão de tuas ruas do bar do porto

                                      São Luís – Península, Capelinha de São Pedro.
                                      Foto: Antonio Aílton

 

estão lá os rastros

de meus pares os cânticos

de tantos outros de nós

 

 

IX)

apesar de todos os reveses

arremessas as trilhas ao mar

 

nas baías de são marcos

ou de são josé de ribamar

 

quem nasce nesta ilha

se é que nunca sentiu

 

quem passa por ela

sempre vem para ficar

 

 

 

 

 

 

 

 

 

     

(MESITO, Bioque. Uma estranha maneira de se comparar amanhãs. Guaratinguetá, SP: Penalux, 2021.)