Sacada Literária

Cultura, crítica e divulgação

Poeta Rogério Rocha - Foto: divulgação

A LINGUAGEM DA AUSÊNCIA – e a presença poética de Rogério Rocha

Antonio Aílton

 

Entre os acontecimentos emergentes de dezembro, neste profícuo final de 2023, uma presença fundamental nos convida ao território do sensível e da evocação da ausência. Quase ao “pensar sensivelmente”, porque o lirismo de hoje, mais ainda que o de sempre, se dá o direito de resvalar entre o sentir e o pensar; o som e o sentido – quando o som é o casório sinestésico entre a música e a imaginação, enquanto o sentido acolhe o pensar, que se esgueira pelo poético e arrasta o antigo enigma do Logos – o qual, segundo Heráclito, é aquele que reside nas profundezas da nossa alma, e a amplia.

Mas esse livro, A linguagem da ausência (Zaratustra, 2023), que nos traz Rogério Rocha está, sem dúvida, do lado dessa fulguração pulsante da alma e do corpo, que é a poesia, a qual guarda o silêncio como uma de suas instâncias, mas nele não se limita a ficar.  Seu grito é esse gozo que se interpõe entre o manifesto e o indizível, ou, mais propriamente, entre a presença fenomênica que se dá através da linguagem e a condição prévia do “ainda não”, do ausente, ou do “já ausente”, como fissura. Poesia, sim, o que muito nos alegra, porque senão ele, o poeta, estaria cumprindo apenas um plano lógico-conceitual, o que não é o caso.

Uma discussão mais profunda sobre o livro poderá ter lugar em outras oportunidades. A intenção primeira aqui é apresentá-lo, torná-lo presente através de seus poemas e de sua escritura, já que um livro de poemas nem sempre é só um livro de poemas, mas é tudo aquilo que o compõe.

E há, nessa composição, é claro, os fundamentais poemas, mas há também prosa poética, há esse objeto-livro que se constrói com texturas, hiperlinks, imagens de lusco-fusco, sapatos e escadarias, e há textos literalmente brilhantes (porque lançam luz sobre nosso olhar), de convite para a percepção do livro e seu entorno, que são os textos dos filósofos Marco Rodrigues e Ivan Pessoa, autoridades na dissecação dos fenômenos do poema, da linguagem e do sentido existencial pela palavra.

Trata-se de um livro robusto, 220 páginas distribuídas em quatro seções. A primeira: Epifanias. A segunda: Enfrentamentos, a qual traz, justamente o poema que dá nome ao título do livro. Seguem-se Evocações e Homenagens, cujos poemas aparecem com dedicatórias a poetas e amigos, fazendo essa ponte entre escrita, vida e afeição. A linguagem da ausência não é, portanto, da ausência do que dizer, mas de uma inscrição nos próprios interstícios que a linguagem e a palavra permitem, porque, por mais que se diga, o indizível permanece como sombra e como assombro. Os silêncios na língua do poeta encontrarão aqueles da experiência do leitor, e nisso há uma comunhão sem voz. E uma comunicação, não por telepatia, mas por conjunção ou contraposição de experiências e sentimentos.

Poetas Antonio Aílton (esq.) e Rogério Rocha (dir.)

Por outro lado, também sabemos que a poesia, formalmente, sobretudo a partir do modernismo, busca dizer o muito com o (falar) pouco, ser condensare/condensação, conforme preconizou Ezra Pound no seu ABC da literatura, assim como tantas e tantas outras considerações sobre o poético e as poéticas modernas/contemporâneas. Rogério se apropria aqui, no geral do livro, dessa prerrogativa, o condensar. Ele se utiliza da potência de significação adensada, dos espaços da página em branco e sua possibilidade de se tornar lugar imaginativo, lugar de distribuição e agenciamento de silêncios.

Esses são alguns dos elementos que dimensionam o conjunto, a obra, que dá lugar ao dizível e ao indizível, aos quais a poesia eleva ao máximo grau – de explosão de sentidos, e da nem sempre irremissível busca dele. Isto porque a linguagem do divino, naquela acepção heideggeriana, nem sempre se faz pelo dado da fala ou pela lógica do sentido, ela está sempre “a caminho”. E é nesse caminho que, penso, Rogério Rocha nos oferta o seu A linguagem da ausência.

 

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ALGUNS POEMAS DE  A LINGUAGEM DA AUSÊNCIA

 

O CORPO

meu corpo

é um fantasma

do avesso

 

 

BARCO

vai vazio

sobre

o mar

distante

 

náufragos

que deliram

expostos

ao sol e

ao ócio

do paraíso

 

vinde a mim

teu voo

condoreiro

[…]

 

 

 

AO FILHO BEM-VINDO

Gosto de andar

           de mãos dadas

                          contigo

pelas ruas infinitas:

          os dois em total

desabrigo.

 

 

SIAMESES

Somos os mesmos

entulhos do escombro.

       Somo unos, ombro a ombro.

Um ao outro, choros somados,

           ao inferno da apatia condenados.

Somos pobres sementes sem sorte

      de uma só e insana flor.

Aquela flor silente e torta

          de um amor à flor da morte.

 

DYLAN THOMAS

Observo-te sentado na varanda

Dos teus sonhos e pesadelos

No chá da tarde que não veio

 

Percebo tua face levemente rósea

E nesgas de luz resplandecendo

Por sobre a tua mão direita

 

Um olhar para dentro se forma

Nas veias da verdade passeia

Mágico, a construir teu império.

 

Abro o livro da tua vida

Ao ver no espelho os pássaros

Que voltam felizes ao pouso seguro

 

Choro ao encontrá-lo vivo

No berço da mãe clandestina

A reler versos de despedida

 

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Rogério Rocha (São Luís/MA) é um pensador, poeta e produtor cultural, graduado em Filosofia e Bacharel em direito, pós-graduado em Direito Constitucional e Ética e mestre em Criminologia. É membro da Academia Poética Brasileira, da Academia de Letras Artes e Ciências do GOB-MA, e da Academia Maçônica de Letras – MA.

É membro-fundador e organizador de projetos Iniciativa Eidos e do Duo Litera, que realizam eventos de Literatura e Filosofia. Autor do livro Pedra nos Olhos (2019).

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Como adquirir o livro:

Com o próprio autor, pelo perfil do Instagram: @filosroger e pelo Facebook: Rogério Rocha.

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