Sacada Literária

Cultura, crítica e divulgação

CLARIDADE DA GENTE: o ethos revolucionário na poesia de Paulo Rodrigues

Evilásio Júnior

 

Fonte: editorapenalux.com.br

Paulo Rodrigues é um poeta que tem consciência da palavra e da importância das lutas humanas. A palavra poética de Rodrigues não está distanciada do mundo das coisas, busca uma relação concreta com os acontecimentos, sem perder de vista a força do simbólico. O livro A Claridade da Gente, lançado pela Penalux, em 2023, acende  uma luz sobre nossa obscuridade enquanto nação, pensando as relações pela ótica dos oprimidos, dos invisibilizados, daqueles que lutam pela sobrevivência, por um pedaço de chão, vítimas das diversas violências que assolaram o Brasil de ontem e ainda permanecem entranhadas no que somos.

A obra está divida em três seções: Fuso, O Regresso da Semente e Quilombola Onça. São trinta e oito poemas que reluzem sobre opacidade do povo brasileiro. Com uma foice afiada, Paulo abre possibilidades para pensarmos a formação do país, revelando um lado eclipsado do homem dos “tristes trópicos”, legatório da herança de um recente passado escravagista, cheio de brutalidade, que deixou as suas marcas em todo o tecido social, principalmente nos descentes dos negros e dos povos originários. 

Em Curionópolis, encontramos a seguinte passagem: “por um segundo esqueceu/ os trabalhos precários, / a mina e o ouro”. Quem é o homem que pensa sobre essa precarização do trabalho? Aliás, quem é esse homem que no barraco, construção rústica que serve como moradia, que se esquece, mesmo por um curto espaço de tempo, da dureza da vida que consome o seu sossego, os seus ossos? Paulo toca nas feridas abertas na terra e na gente, usando a lâmina da poesia para refletir a condição dos homens e mulheres dos barracos, das roças, dos quilombos, das ruas, para os problemas concretos, ainda que seja através da literatura.

Problemas estes ainda não resolvidos, como a batalha pela terra, tematizada em O latifúndio tem o paletó sujo de sangue, poema de uma beleza visceral, cortante. O poeta vem mostrando a sua verve de pensar o homem brasileiro através da luta, do não conformismo, da revolução. A chacina de Eldorado do Carajás abre as vísceras de um país que ainda não resolveu os conflitos agrários: “o jornal noticia/ que se passaram vinte e cinco anos/ da chacina dos trabalhadores rurais/ em Eldorado do Carajás”.  As mortes ainda pulsam nas lembranças de quem ficou, como se fossem covas ainda abertas, que não cicatrizaram. Contudo, Rodrigues fecha o poema com uma esperança na luta, ainda que o luto também esteja presente: Jane Julia sofreu emboscada, / mas não entregou a foice/ nem a revolução”.

Poeta Paulo Rodrigues, autor de A claridade da gente

 Mesmo exilado em um “país onde é proibido sonhar”, o poeta vai rompendo “A estiagem dos Dedos que não Provam Manhãs”, abrindo as matas fechadas da linguagem, revisitando o peso do passado ainda vivo nas instituições e no homem do Brasil. Às vezes com um olhar de desesperança, Rodrigues planta em nossas retinas o desassossego: “não tenho um cambo de alegria para oferecer. / são desgraças que se mordem e tiram a rede do lugar”.

Há um ethos revolucionário presente na escrita de Paulo Rodrigues, de forma consciente, é claro, refletindo para a mudança do atual estado das coisas: “mas o que muda o mundo/ é a Revolução”. Outro trecho de poema que comprova a nossa abordagem, encontra-se no Centenário do partidão, que nos mostra o seguinte: teceu a revolta proletária no exílio. / morreu acreditando nas mãos operarias”.

A poesia que atravessa o livro A Claridade da Gente, é uma luta corporal com a linguagem, pois o poeta faz um trabalho belíssimo com a palavra, como também, uma luta que valoriza a consciência de classe, a força e a revolução que está na palavra e além dela. A palavra de Paulo Rodrigues é uma foice afiada abrindo caminhos para a consciência de classe, fazendo a lâmina da revolução brilhar nas retinas cansadas dos oprimidos.

 

 

Evilásio Júnior

Poeta