Renata Barcellos*
Este artigo visa apresentar sequências didáticas, nas quais os alunos fizeram a releitura das obras de autores maranhenses em outros diversos modos e gêneros textuais orais e escritos. As propostas pedagógicas foram realizadas no Colégio Estadual José Leite Lopes/ NAVE RJ. Esta instituição oferece um ensino médio integral (das 7h às 17h) e integrado à educação profissional (Mídias digitais e Programação de jogos), resultante da parceria entre a Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro com o Instituto OI Futuro. Trata-se de uma instituição de ensino integrado onde atividades são propostas das diversas disciplinas do núcleo comum e/ou com as do técnico. O público-alvo foram alunos de 2° e 3° anos do Ensino Médio.
Definição de literatura
“A literatura faz é o mesmo que um fósforo no meio de um campo em plena noite. Um fósforo quase nada ilumina, mas permite-nos ver quanta escuridão há à nossa volta.” (William Faulkner)
Antes de entrarmos em uma sala de aula de Ensino Médio para ministrarmos aula de literaturas, precisamos ter consciência da corrente de estudos literários seguida e da definição desta disciplina. Para isso, apresentaremos a seguir algumas definições de estudiosos da área: Literatura é “a expressão de conteúdos ficcionais, por meio da escrita” (MOISÉS, 2007); Literatura é “um sistema composto pela tríade obra, autor, leitor de dada época histórica” (CANDIDO, 2006); Literatura é “uma questão centralizada em aspectos textuais e de linguagem, minimizando fatores extratextuais” (SOUZA, 2005). Hoje, com a nossa imersão em um mundo extremamente midiático, precisamos rever nossas práticas pedagógicas. Não é mais viável, possível e imaginável, desconsiderarmos toda a tecnologia ao nosso redor. Devemos repensar o modo como ministramos todas as disciplinas, sobretudo essa. Primeiramente, é fundamental conscientizarmos os educandos quanto à sua importância no nosso quotidiano. Para isso, apresentamos diferentes gêneros textuais cujo recurso expressivo é a citação ou a intertextualidade de textos dessa natureza. Vejamos o poema Canção do exílio de Gonçalves Dias: “Minha terra tem palmeiras / Onde canta o Sabiá, / As aves, que aqui gorjeiam, / Não gorjeiam como lá”. O educador pode propor: Qual é a sua escola literária? Qual a sua contribuição para a literatura brasileira? O que significam os advérbios “lá” e “cá”?
Atualmente, o educador da disciplina de Literaturas precisa considerar e utilizar os diversos recursos tecnológicos disponíveis a fim de despertar o interesse dos educandos de lerem e refletirem sobre como o autor retratou seu tempo. Defendemos a tese de que todos devem ler, obrigatoriamente, um livro por bimestre, independente de ser uma instituição pública ou privada. Quanto àquela, cabe ressaltar que não é justificativa dizer ser inviável, porque não comprarão o livro solicitado. Para evitar isso, sempre disponibilizamos na primeira semana do bimestre a obra em PDF no grupo do Facebook e, hoje, no Google Sala de Aula e no grupo de WhatsApp.
Há um discurso clássico de que a escola “poda” o incentivo à leitura. Diante dessa constatação que atravessa os tempos, percebemos que há algo de inadequado na nossa prática. Como pode um educador desta disciplina declarar não gostar de ler??? É altamente contraditório. Pior, antes, quando só aceitava a resposta de acordo com a sugerida pelo livro. É necessário que continue estimulando o hábito de leitura, dê voz aos educandos, permita-lhes expor suas ideias, suas impressões sobre o texto lido…
Práticas pedagógicas de Literatura Maranhense
As literaturas têm como objetivo manter viva a memória de um povo, no seu tempo. Elas podem expressar o engajamento social, a expansão da imaginação, fazer compreender os atos das pessoas, observar os sentimentos delas, entretenimento… Com as literaturas, é possível analisar comportamentos e desvendar mistérios, relembrar fatos históricos… Haja vista que as suas funções são: estética, político social, lúdica, catártica e cognitiva. Assim, cada autor tem seu perfil.
É preciso que o aluno esteja diante de uma proposta pedagógica na qual as Literaturas sejam fonte de reflexão para o indivíduo explorar seu meio e criar seus sonhos e expectativas. Segundo TODOROV, elas “nos proporcionam sensações insubstituíveis que fazem o mundo real se tornar mais pleno de sentido e mais belo. Longe de ser um simples entretenimento, uma distração reservada às pessoas educadas, ela permite que cada um responda melhor à sua vocação de ser humano.” (2009, p.24). Podemos viajar no tempo através do ato da leitura, pela simples satisfação de explorar as literaturas. Não compreender a função social delas e se restringir aos estudos literários (decorar autores e obras) pode levar o aluno leitor ao desestímulo por não despertar o desejo pela leitura.
Urge discutir a diversidade de literaturas e de leitores, ao contrário, realizar atividades de interdisciplinaridade entre algumas áreas do conhecimento… Mas, na maioria das vezes (no público e ou privado) a realidade é: um desfile de referências soltas, as quais os alunos são obrigados a repetir em nome daquele modelo de educação literária. No ensino médio, infelizmente, também a disciplina restringe-se ao biografismo e no historicismo monumentalista. Não se aprecia os escritores pelos seus textos, mas por acúmulo de informações sobre seus feitos e suas glórias (PAULINO; COSSON, 2009, p. 71-72).
PROPOSTA 1: Poemas de Gonçalves Dias
A intertextualidade ocorre em diversas áreas do conhecimento. Eis abaixo uma a partir do poema Canção do exílio de Gonçalves Dias:
“Minha terra tem amores,
Os pássaros aqui gorjeiam,
Pousam nas lindas flores,
Mas, em São Luís floreiam!”
E outra dos Timbiras de Gonçalves Dias:
“Meu canto de desespero
Brasileiros, proferi
Sou filha da educação,
Na sala de aula, cresci”
Retextualização: Os alunos apresentam a retextualização do poema escolhido de Gonçalves Dias. Um exemplo foi a turma 3003/2023: um grupo (Renato, Isabela, João Pedro e Sophia) compôs uma música. Está disponível no fim da mesa-redonda em homenagem ao Bicentenário do autor:
PROPOSTA 2: Leitura de a fragmentos do romance Os tambores de São Luís, de Josué Montello
- Assistir a documentários composta por pesquisadores especialistas neste autor e, depois, debater:
https://www.youtube.com/watch?v=VT_k6Ud_9fs
- Elaborar retextualizações. Exemplos:
Fragmento 1:
“A pancada caiu-lhe em cheio na palma da outra mão, e ele estremeceu, reprimindo o grito que lhe quis forçar a boca. Com dezoito anos feitos, era a primeira vez que apanhava […] De modo que, agora, recebendo o castigo imerecido, juntava à dor o sentimento do ódio, era com esforço que se mantinha no chão, recebendo as bordoadas” (MONTELLO, 1985, p. 52).
Slam:
Dor e injustiça
Voz silenciada
Ódio crescente em seu âmago
Ante sua alma maltratada
Esforçando-se para manter a si mesmo submisso
Ainda que recebendo bordoadas.
PROPOSTA 3: A Cega, de Viriato Correia; À Procura de Heróis, de Sanatiel Pereira; O Pão dos Mortos, de Arthur Prazeres
RETEXTUALIZAÇÕES: Dos textos desta proposta , foi solicitado que os alunos elaborassem um parágrafo crítico e um texto argumentativo acerca do tema tratado da obra escolhida.
Considerações finais
Quanto às Literaturas, é preciso que o professor leve o aluno a compreender tratar-se do homem no seu tempo (contexto vivenciado). No Brasil, por ser extenso, há diversas influências. Por isso, defendemos ser Literaturas brasileiras, indígenas e africanas. Devemos instigar a leitura dos clássicos e dos contemporâneos. Ler textos das diversas regiões do país (inclusive do Maranhão, haja vista ser ano do Bicentenário de Gonçalves Dias). Com este artigo, esperamos instigar o professor leitor a reproduzir estas práticas ou propor outras inovadoras. O importante é arriscar-se. Não temer ousar. A palavra-chave do século XXI é INOVAR.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Secretaria de educação fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Língua Portuguesa. Brasília: SEF, 1998.
CANDIDO, Antonio. A literatura e a formação do homem. Ciência e Cultura, v. 24, n. 9. São Paulo, 1972.
COLOMER, Tereza. Andar entre livros. São Paulo: Global, 2007.
LEAHY-DIOS, Cyana. Educação literária como metáfora social: desvios e rumos. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
MOISÉS, Leila Perrone. Mutações da literatura no século XXI. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
*Renata Barcellos é pós-doutora em Literatura, autora das obras Gramática contextualizada, Itens do Novo Enem, Barcellos em prosa e verso e Barcellos e Viana: um encontro. Também é coautora de antologias poéticas e de diversos artigos sobre o ensino da Língua Portuguesa, além de ser também colunista do Portal Sem Fronteiras (BarcellArtes) e do Pauta Nossa (Agenda Cultural ).
e-mail: [email protected]
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